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planetamarcia

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Setembro 15, 2014

A Improvável Viagem de Harold Fry - Rachel Joyce - Opinião

 

Harold sai um dia de casa para levar uma carta ao correio e faz uma caminhada de mil quilómetros. Decidiu entregar a carta pessoalmente, caminhando até ao destino.

Surpreendente? Foi o que achei. Pelo menos no início do livro. Quer dizer, continuei sempre a achar surpreendente, irreal e um bocado louco. É altamente improvável que Harold, sexagenário, pudesse atravessar a Inglaterra a pé, com calçado e roupa do dia-a-dia, e sem qualquer preparação física.

Mas, nesta sucessão de absurdos, a leitura vai prosseguindo, devagar como a caminhada de Harold, sem fé e ao acaso de início, mas acreditando nos seus propósitos a cada passo.

Entendi esta viagem como um percurso interior. Uma viagem ao passado pela terapia da caminhada e da solidão. Harold partilha pensamentos com o leitor, logo me apercebi de uma grande necessidade de superar e fazer pazes com o passado. A viagem para visitar e “salvar” uma amiga da morte é uma desculpa para fugir da tristeza em que vive. Saberemos o que atormenta Harold há tantos anos. Um passo de cada vez.

Esta análise do passado e busca de redenção é uma ideia óbvia, a cair no lugar-comum. A ideia de expiação associada às dificuldades do percurso, quer seja por enfrentar a intempérie, por aguentar as bolhas dos pés sem tratamento, por dormir ao relento ou onde calhar, é pouco original. Mas o certo é que resulta. Li o livro até ao fim respeitando o ritmo de Harold. Senti a paz do desenvolvimento lento da narrativa, a certeza de revelações futuras deu-me temperança de ler com calma.

Um livro que tem o propósito de trazer fé. De aliviar e apaziguar. Como que nos sussurra “vai ficar tudo bem”. O sucesso deste propósito depende, contudo, da disposição que quem lê tem de se deixar levar.

Uma reflexão sobre o efeito que a força de acreditar pode ter.

Gostei. Mas esperava mais.

“ Eu não sou melhor do que qualquer outra pessoa. A sério que não. Qualquer pessoa pode fazer o que eu estou a fazer. Mas temos de nos libertar das coisas. Eu não sabia no início, mas agora sei. Temos de nos libertar das coisas de que julgamos precisar, como os cartões de crédito e os telemóveis e os mapas e montes de outras coisas. – Os olhos dele brilhavam e o seu sorriso mantinha-se imenso.” (Pág. 238)

Sinopse

“Para Harold Fry os dias são todos iguais. Nada acontece na pequena aldeia onde vive com a mulher Maureen, que se irrita com quase tudo o que ele faz. Até que uma carta vem mudar tudo: Queenie Hennessy, uma amiga de longa data que não vê há vinte anos, e que está agora doente numa casa de saúde, decide dar notícias. Harold responde-lhe rapidamente e sai para colocar a carta no marco do correio. No entanto, está longe de imaginar que este curto percurso terminará mil quilómetros e 87 dias depois. E assim começa esta improvável viagem de Harold Fry. Uma viagem que vai alterar a sua vida, que o fará descobrir os seus verdadeiros anseios há tanto adormecidos e sobretudo vai ajudá-lo a exorcizar os seus fantasmas.”

Porto Editora, 2014