Já chegou e está disponível para leitura aqui, através do dispositivo mais à mão!
Descubram as novas participações e as do costume, leiam, leiam, leiam tudo! Um miminho especial de boas-vindas à Inominável Isaura Pereira, do blogue Jardim de Mil Histórias, companheira das andanças blogo-literárias e uma leitora cujas opiniões muito estimo. Descubram-na na página 82, Ela promete Ler o Mundo!
Partilho aqui o meu texto para o Anexo (pág.70) desta edição:
A Terapia dos Livros
Recentemente têm surgido alguns “consultórios literários” e também livros que difundem a ideia de terapêutica através da leitura. Pessoalmente este conceito não me oferece nada de novo, pois eu já me “automedico” com livros há muitos anos. Sei por experiência o efeito que um livro que me agrada tem no meu bem-estar mas, inevitavelmente, e por ter a leitura como uma actividade tão pessoal, hesito em acreditar sem reservas nos “médicos dos livros”.
Já li sobre consultas online e também sobre consultórios fora do espaço virtual, o que não deixa de me surpreender numa época em que todos nos afastamos fisicamente, tendendo a preferir a comodidade das ligações no ciberespaço. Folheei um livro que é um verdadeiro compêndio de mezinhas, substituindo a camomila, a tília e demais plantas ou substâncias por géneros literários, autores ou mesmo títulos concretos, recomendados para distintas maleitas.
Aprecio todas as formas de promover a leitura e sei que os livros que nos preenchem são inevitavelmente uma forma de bem-estar, mas poderá alguém que não me conhece opinar sobre o livro que me fará recuperar de uma constipação? Não me parece. Até porque, por muito que um livro afaste indisposições, não lhe reconheço capacidade de atenuar febre e pingo do nariz. Ou seja, reconheço o potencial da literatura em processos de atenuação de mal-estar mas, como com qualquer banha da cobra, há que estar de pé atrás e não se deixar levar por milagres. Inevitavelmente, acho piada a esse tipo de compêndios (como não gostar de uma medicina dos livros ou dos médicos que prescrevem literatura?), mas arrisco a manter o meu próprio receituário.
Possivelmente estas “consultas” serão proveitosas para quem se inicia na leitura e terá necessidade de orientação. Mas não poderão as bibliotecas ter esse papel? Não será mais inteligente (e mais barato) procurar essa orientação na biblioteca junto de quem (supostamente) ama os livros e lhes dedica os seus dias? Até porque existe a possibilidade de levar livros para casa e fazer todos os testes terapêuticos que se desejar sem custos. Parece-me uma aposta vencedora. Assim como frequentar livrarias, aquelas lojas que vendem livros (só livros) e têm senhores e senhoras chamados livreiro(a)s, que devem ser dos nossos melhores amigos e inestimáveis conselheiros. Melhor que o sofá do psicólogo será tomar assento na livraria, escolher uma pilha de livros e seleccionar romances, contos, ensaios, poesia com a ajuda desse mestre que o(a) livreiro(a) deve ser na vida de um leitor.
Quando me perco por estas reflexões acabo por me entristecer com as tentativas de fazer negócio de algo tão pessoal e fundamental ao crescimento interior de cada um. Mais do que uma posologia diária, um livro é uma arma de enriquecimento individual com um poder único. Pensará por si um leitor que lê o que lhe impingem com a desculpa da cura? Ou será mais forte e imune aquele que procura o seu caminho numa perspectiva de tentativa e erro? Aquele que tanto adora como odeia um livro, que tanto o lê de modo compulsivo como tem ganas de o atirar janela fora. Aquele que pensa e defende convicções. Aquele que segue o seu caminho, mesmo quando o desvio do rebanho é inevitável.
Todos ganhamos em ser, pelo menos uma vez, a ovelha negra de um grupo. Significa que temos a capacidade de fazer escolhas, de dizer não, neste caso específico temos a liberdade de escolher o que nos alimenta a alma. Dessa forma acredito na cura pelos livros. De outro modo será apenas comprar um bilhete para a viagem que toda a gente faz. Eu por mim gosto de descobrir novos destinos.