Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

planetamarcia

planetamarcia

Novembro 27, 2016

Apresentação de Homens Imprudentemente Poéticos, de Valter Hugo Mãe, na Livraria A das Artes

A livraria A das Artes, em Sines, abriu as portas para receber Valter Hugo Mãe na passada sexta-feira, 25 de Novembro.

Estão por inventar palavras que possam fazer justiça à generosidade do Joaquim Gonçalves em convidar-me para participar na apresentação do livro Homens Imprudentemente Poéticos.

IMG_4927.jpg

Partilhar a mesa com um autor extraordinário e com um amigo querido, e poder interagir com os leitores que encheram (literalmente) o espaço, criando um ambiente de conversa informal, é algo não poderei esquecer.

Obrigada, Joaquim, por tudo.

Obrigada, Valter, pelas palavras sempre perfeitas.

Obrigada aos leitores presentes, pelo carinho. Pelas questões interessantes colocadas ao autor. Pela participação activa num encontro que foi uma conversa de amigos.

Contribuí com palavras. Aqui as deixo.

 

A minha leitura de Homens Imprudentemente Poéticos, de Valter Hugo Mãe

Foi como ser abrigada pelo silêncio. E eu gosto do silêncio. Tanto que o procuro sempre, e abrigo-me nele como quem se aconchega debaixo de uma asa cálida.

Este livro trouxe-me silêncio. Porque quando entrei nas suas páginas o mundo calou-se. Não havia mais nada além das palavras. Que não foram serenas. Nem me trouxeram paz. Nem mesmo o amado silêncio. Estas palavras são mágicas. Rodearam tudo de silêncio para, só elas, serem escutadas.

Avançar nas páginas foi como submergir, como se a leitura fosse criando uma bolha que isola quem lê, como se o livro passasse a ser dono do espaço, do tempo, e até do ritmo. Ler Homens Imprudentemente Poéticos é obedecer. É ler ao compasso imposto, lento, por vezes arduamente lento, como se uma página pudesse durar dias e a releitura fosse uma urgência, uma imposição que, de cada vez, oferecia novas descobertas.

A delicadeza habitual da escrita de Valter Hugo Mãe funde-se de modo perfeito na serenidade do Japão, país que mesmo para a guerra se apoia na concentração, em que a violência é pensada, meditativa, mas não menos mortal. Das artes marciais ao Ikebana os mesmos princípios, mas objectivos tão díspares quanto a morte e a beleza contemplativa.

A simplicidade, quase infantil, é um engodo hábil em que me enredei sem resistência, cedendo com prazer à narrativa poética que, ardilosa e bastante mais complexa do que se suspeita à partida, me foi surpreendendo com ocasionais socos no estômago, dos quais não me queixo. Ao contrário, agradeço. Ou não fossem as leituras dolorosas as que mais marcam, e as que guardo de forma definitiva nas minhas memórias mais singulares.

A viagem é longa. Mas apesar do Japão ser distante as premissas de Homens Imprudentemente Poéticos são comuns a todas as geografias. Há o ódio que, não se sabendo bem porque surge, é alimentado de picardias e provocações numa sucessão de dias que lhe dão uma dimensão irracional. Tão longe pode ir a aversão ao próximo que a morte se afigura como uma possibilidade lógica. A violência é apenas mais um passo. O medo é inexplicável, mas todos o sabemos sentir. Na relação de dois vizinhos que se atormentam de ódios, e vivem entre a defesa e o ataque como num campo de batalha, o medo é inevitável. É como uma corda que num dia é puxada com mais afinco por um, e no outro dá mais metros ao seu inimigo. O receio da corda quebrada é palpável e a espera consome por dentro.

Ítaro e Saburo são os vizinhos que se perseguem e controlam. Com as mesmas mãos com que criam beleza, Ítaro pinta leques muito belos e Saburo produz peças de olaria, procuram concretizar vinganças. As mesmas mentes que pensam beleza planeiam maldades, numa constante dualidade. Ou não fossem eles humanos.

É curioso como um livro que, geograficamente, leva o leitor para longe e lhe apresenta uma floresta feita de silêncios, pode transmitir uma sensação de tão forte proximidade. As diferenças culturais são evidentes, mas nem mesmo os distintos modos de encarar a morte trazem maior ou menor poder sobre o que se teme. Ou sobre aquilo de que se sente falta. E é, por vezes, no escuro que melhor se vê o caminho, escutando os sentimentos ao mesmo tempo que se tapam os olhos.

“A cegueira era, a cada instante, uma expansão”. (Página 205)

Como o próprio Ítaro que, no seu confronto forçado com as sombras, encontra no fundo de um buraco escuro a pessoa que ainda não tinha descoberto na superfície. Há um renascimento no enfrentar do medo, não o subestimando, mantendo o temor e até mesmo criando dependência daquilo que se receia. A viagem do auto-conhecimento é solitária.

Homens Imprudentemente Poéticos descobre-se aos poucos. Exige a entrega que já referi. Espanta pela linguagem destemida, diferente, a que parecem faltar palavras que afinal não fazem falta. Tem a originalidade de quem escreve sem medo do risco. De quem escreve como quer. De quem escreve como sente.

Sublinho e faço anotações nos meus livros. Coloco marcas com a ideia do regresso. Neste caso refreei o impulso, por recear sublinhar o livro todo.

Homens Imprudentemente Poéticos não se esgota nas vezes que se relê. É uma leitura que termina nunca.

 

homensimprudentementepoéticos.jpg

Sinopse

"Num Japão antigo o artesão Itaro e o oleiro Saburo vivem uma vizinhança inimiga que, em avanços e recuos, lhes muda as prioridades e, sobretudo, a capacidade de se manterem boa gente.
A inimizade, contudo, é coisa pequena diante da miséria comum e do destino.
Conscientes da exuberância da natureza e da falha da sorte, o homem que faz leques e o homem que faz taças medem a sensatez e, sobretudo, os modos incondicionais de amarem suas distintas mulheres.
Valter Hugo Mãe prossegue a sua poética ímpar. Uma humaníssima visão do mundo."

Porto Editora, 2016

Novembro 21, 2016

Valter Hugo Mãe na A das Artes - 25 de Novembro, pelas 21h00

convitevhm.jpg

Valter Hugo Mãe estará na livraria A das Artes, em Sines, no dia 25 de Novembro, para uma sessão de apresentação do novo livro, Homens Imprudentemente Poéticos (Porto Editora).

A convite do Joaquim Gonçalves, que muito agradeço, irei participar nesta sessão, apresentando o livro com a Dina Silva.

Estão todos convidados e espero ver-vos lá!

 

Novembro 13, 2016

A Célula Adormecida - Nuno Nepomuceno - Opinião

acelulaadormecida.jpg

A leitura foi rápida. As quase seiscentas páginas são feitas de adrenalina e o ritmo imposto não tem piedade do leitor. Mas isso eu já esperava, pois foi assim com a Trilogia Freelancer (O Espião Português, A Espia do Oriente e A Hora Solene). Desta vez eu queria mais.

Tem-se tornado algo difícil ler os livros de quem estimo. E o Nuno, pela sua dedicação e capacidade de trabalho, é um autor que cada vez mais admiro e que gosto de acompanhar de perto. Curiosamente, em vez de me tornar benevolente e dar palmadinhas nas costas, torno-me mais exigente e severa com as pessoas de quem gosto. Mas só com aquelas que acho que podem chegar mais longe. É uma forma esquisita de demonstrar carinho, eu sei, mas sou dura porque acredito e porque quero (quero mesmo) que quem tem talento e investe tempo e suor na escrita tenha a devida compensação.

Bom, está mais do que visto que esta opinião dificilmente será imparcial, mas, dada a natureza do que explico acima, o meu grande receio era prejudicar o autor. E isso eu não podia conceber.

O livro está lido e os receios postos de parte. O Nuno superou as expectativas e poupa-me os remorsos de ter que escrever que esperava melhor. Bom, na verdade espero mais. Espero sempre. Mas para o próximo livro.

Depois desta longa introdução quero dizer-vos que esta foi uma leitura envolvente, com várias áreas de acção, cheia de mistério e pulso acelerado. O tema é extraordinário, não só por ser actual, mas por permitir tantas possibilidades de intriga que o Nuno soube (muito bem) aproveitar.

Quem nunca pensou na possibilidade de um atentado terrorista em Portugal? Nos tempos que correm é fácil conceber essa hipótese, infelizmente. Um atentado em Lisboa na noite das eleições legislativas é a premissa para esta fantástica viagem que, mais do que um romance policial ou de espionagem, é uma brilhante chamada de atenção para a intolerância religiosa.

É notória a pesquisa e a preparação do autor para este livro, eu diria até notável, e, ao contrário do que verifiquei nos livros anteriores, a forma como a informação passa para o leitor é mais cuidada. Os dados (políticos, sociais ou geográficos) são tema suculento de diálogos, por vezes acesas discussões que aumentam o estado de alerta para assimilar informação. Os locais vão sendo descritos de modo cadenciado, sem precipitações, como um palco que vai sendo montado à medida que se desenrola a trama. Em algumas ocasiões senti que podia estar a ler um livro de viagens, nomeadamente na parte que decorre na Turquia.

Em resumo, neste novo livro, Nuno Nepomuceno toca na ferida de temas polémicos da actualidade com a sua escrita envolvente e elegante. De forma fluída e muito bem conseguida expõe o drama dos refugiados sírios, o conflito do médio oriente (ou talvez conflitos seja mais adequado) e a guerra do petróleo. Mostra uma Lisboa multicultural e (infelizmente) intolerante. Leva o leitor pela mão à Mesquita Central de Lisboa e ensina (ou não tivesse sido ele professor) o que significa ser muçulmano. Faz uma viagem pelo mundo fútil de quem vive da imagem e pela manipulação dos media. Apresenta uma das minhas personagens preferidas de sempre, Afonso Catalão, que, como tem de ser, não é o que aparenta. E é, de resto, o principal símbolo da maturidade deste livro. André Marques-Smith ficou lá atrás. Confesso que gostava de me voltar a encontrar com o Afonso noutros livros.

Se é previsível? Sim, quanto baste, mas se calhar no que menos importa. Descansem que as surpresas são muitas e estarão constantemente a repetir com os olhos arregalados “só mais um capítulo!”.

Leiam-no! É aposta segura.

Sinopse

“Em plena noite eleitoral, o novo primeiro-ministro português é encontrado morto. Ao mesmo tempo, em Istambul, na Turquia, uma reputada jornalista vive uma experiência transcendente. E em Lisboa, o pânico instala-se quando um autocarro é feito refém no centro da cidade. O autoproclamado Estado Islâmico reivindica o ataque e mostra toda a sua força com uma mensagem arrepiante.
O país desperta para o terror e o medo cresce na sociedade. Um grande evento de dimensão mundial aproxima-se e há claros indícios de que uma célula terrorista se encontra entre nós. Todas as pistas são importantes para o SIS, sobretudo, quando Afonso Catalão, um conhecido especialista em Ciência Política e Estudos Orientais, é implicado.
De antecedentes obscuros, o professor vê-se subitamente envolvido numa estranha sucessão de acontecimentos. E eis que uma modesta família muçulmana refugiada em Portugal surge em cena.
A luta contra o tempo começa e a Afonso só é dada uma hipótese para se ilibar: confrontar o passado e reviver o amor por uma mulher que já antes o conduziu ao limiar da própria destruição.
Com uma escrita elegante e o seu já tão característico estilo intimista e sofisticado, inspirado em acontecimentos verídicos, Nuno Nepomuceno dá-nos a conhecer A Célula Adormecida. Passado durante os 30 dias do mês do Ramadão, este é um romance contemporâneo, onde ficção e realidade se confundem num estranho mundo novo e aterrador que a todos nos perturba. Um thriller psicológico de leitura compulsiva, inquietante, negro e inquestionavelmente atual.”

Topbooks, 2016

Novembro 07, 2016

A Vida no Campo - Joel Neto - Opinião

avidanocampo.jpeg

Li Arquipélago. Viajei na Ilha Terceira. Trago memórias de umas férias especiais e na bagagem veio A Vida no Campo.

Este texto será breve. É apenas uma anotação do tanto que gostei e me deixei envolver pelas histórias e reflexões do autor. A Vida no Campo é um diário de alguém que deixou a cidade depois de vinte anos a corresponder às exigências da carreira, a viver no meio do ruído, a não ter tempo sem disso se aperceber. Assim como eu e tantas outras pessoas.

Ler este livro não é só um passeio na fantástica ilha Terceira. É uma tomada de consciência. É um acordar meigo para o que a vida poderá ser. Um empurrão para quem queira ser empurrado, ou se vá deixando empurrar pela perspectiva do plano. Mudar de vida é possível apesar das dificuldades, muitas delas criadas pelos próprios receios.

Para mim, além de uma (boa) provocação dado que anseio por uma paz semelhante, foi um complemento à minha viagem. Foi-me arrancando sorrisos e suspiros quando lia sobre alguns dos locais que visitei, dos restaurantes onde comi, e que me foi abrindo (ainda mais) o apetite para a admirável gastronomia, dado que Joel Neto não se poupa a discrições suculentas do que lhe vai passando pelo prato.

Vacas, igrejas, mil tons de verde, neblinas misteriosas, personagens de Arquipélago (desconfio que encontrei algumas neste Vida no Campo), voltaram para mim a cada página. Regressar aos Açores é um dado adquirido, até lá a viagem faz-se em releituras.

Partilho o booktrailer. Acho-o irresistível.

Sinopse

“Um homem e uma mulher. Um jardim e uma horta. Dois cães. Ao fim de vinte anos na grande cidade, Joel Neto instalou-se no pequeno lugar de Dois Caminhos, freguesia da Terra Chã, ilha Terceira. Rodeado de uma paisagem estonteante, das memórias da infância e de uma panóplia de vizinhos de modos simples e vocação filosófica, descobriu que, afinal, a vida pode mesmo ser mais serena, mais barata e mais livre. E, se calhar, mais inteligente.”

Marcador, 2016

Novembro 03, 2016

Desde a Sombra - Juan José Millás - Opinião

desdeasombra.jpg

Desde a Sombra, de Juan José Millás, foi a leitura deste mês da Comunidade de Leitores em que participo. Um livro que se lê numa penada, com interesse constante. A escrita fluída e descomplicada proporciona uma leitura rápida, nada cansativa, e bastante prazerosa. Mas, e porque há sempre um mas, Desde a Sombra não é tão simples ou linear como parece. E ainda bem.

Damián esconde-se dentro de um armário numa feira de antiguidades (os motivos da necessidade de esconderijo deixo para descobrirem quando lerem o livro) e, não conseguindo sair sem ser visto, deixa-se ficar no armário até ser transportado para a casa de Lucia. Parece de loucos, não? E é. Mas a verdade é que a escrita de Millás faz desta premissa uma situação perfeitamente credível. Há um homem dentro de um armário no quarto de casal, onde decide ficar a viver passando despercebido. Ou talvez não, pois quando a família sai para o trabalho e para a escola, Damián sai do seu aconchego (espaço que tornou confortável e onde se sente bem) e arruma a casa. Lucia é a única que se apercebe que são feitas limpezas, tanto o marido como a filha assumem que o trabalho é feito por ela, como habitualmente. Lucia acredita que tem em casa um fantasma que trata da manutenção do lar, e chega a estabelecer contacto com ele através de canais muito especiais (mais uma para descobrirem lendo o livro).

Para ajudar à festa há um programa de televisão em directo, uma espécie de reality show onde Damián vai exorcizando alguns demónios (picos de audiência, claro) e mantendo o público a par da sua aventura no armário.

Eu sei que parece muito confuso e bastante louco, mas só um livro fabuloso conseguiria que todos estes detalhes esquizofrénicos que descrevo fizessem (muito) sentido. A escrita de Millás é descomplicada como referi no início, mas apenas aparentemente, pois apesar de se ler muito bem e de ser bastante acessível, assenta numa estrutura habilmente construída que permite ao leitor passear (literalmente) pelos pensamentos cruzados de Damián. E acreditem que são muitos pensamentos, muitas ideias, muita coisa a acontecer ao mesmo tempo naquela cabeça.

Passando do hilariante ao soturno de forma vertiginosa, Millás obriga à reflexão sobre temas como a solidão, traição, mentira, traumas de infância, anorexia e futilidade, com um sorriso nos lábios.

Foi uma extraordinária leitura, que recomendo sem reservas, e que proporcionou uma das melhores discussões da comunidade. Curiosamente estivemos todos de acordo (coisa rara), Desde a Sombra é genial!

Fica a enorme vontade de descobrir outros títulos do autor.

Sinopse

“Um romance no mais puro estilo Millás: surpreendente, inquietante, original, brilhante: Um protagonista, um homem comum «empurrado» para uma situação extraordinária; um argumento fora do normal com um desfecho imprevisto e inquietante; uma combinação magistral de humor, suspense, com diálogos que têm um olhar lúcido sobre a realidade dos nossos dias.
O romance é uma análise crua das fobias e receios dos nossos dias, focando o medo de falhar como pessoa.”

Planeta, 2016

Tradução de Mário Dias Correia

Novembro 01, 2016

Arquipélago - Joel Neto - Opinião

arquipelago.jpg

Já não se escrevem livros assim. Foi o que me disse um amigo acerca deste Arquipélago. E é verdade.

Comecei a lê-lo algum tempo antes de ir aos Açores, na expectativa de iniciar uma leitura que levaria a cabo na ilha Terceira, no cenário do livro. O facto de o ter iniciado algum tempo antes da viagem não me levou a imaginar que o livro se esgotaria antes da partida, ou que me sobrariam apenas meia dúzia de páginas para entreter parte do percurso. Leio sempre vários livros ao mesmo tempo e gosto de “saltar” entre romances, contos e novelas gráficas, portanto um romance de mais de quatrocentas páginas iria durar com certeza.

Mas na verdade aconteceu-me o que já não sucedia há muito tempo. Dediquei-me à leitura de Arquipélago em exclusivo. Não que o tivesse escolhido (ao contrário), mas parece que o livro me escolheu. Não o consegui largar até chegar ao fim, dando por mim muitas vezes, durante o dia, ansiando pelo regresso às suas páginas. Não houve outros livros. Não era possível tirar-me do cenário, arrancar-me da história, demover-me da escrita elegante e envolvente de Joel Neto. É bom encontrar, finalmente, um livro que me leve com ele. É essa sensação de resgate que procuro incansavelmente, e tão poucas vezes encontro.

Gostava de vos contar esta história. Falar sobre as personagens, os seus percursos e encontros. Revelar mistérios e, em surdina, segredar uma história de amor. Mas seria tão pouco, estaria tantos degraus abaixo de experiência que é ouvir as aves, sentir a chuva, e até os abalos, percorrer os anos passados em revelações surpreendentes, conhecer as famílias da trama, e até a intimidade secular de uma ilha surpreendente.

Arquipélago parece um romance de outros tempos, que se abre numa tábua de personagens. Oferece de imediato os nomes e algumas pistas a que voltei, continuamente. Não estava preparada para uma estrutura tão forte e um argumento tão bem elaborado, com acção, reviravoltas imprevistas, histórias dentro de histórias e, acima de tudo, não estava preparada para as palavras feitas de sentimentos. Não imaginava que Joel Neto escrevesse assim, e a maior surpresa foi a emoção que algumas frases me proporcionaram.

Já regressei da viagem. Da viagem aos Açores, porque ainda passeio nas palavras do livro com as memórias desta leitura extraordinária. E também pelas páginas do mais recente A Vida no Campo, por não resistir a continuar embalada pelas avassaladoras paisagens.

Partilho duas fotografias de uma pequena expedição, não por páginas, mas por caminhos. Como não visitar a Terra Chã, estando lá?

arquipélago2.jpg

arquipelago1.jpg

Pode um livro publicado há um ano ser um clássico?

Não sei. Contudo, para mim será. Não o vou esquecer. Ficará comigo.

Sinopse

“Açores, 1980. Uma criança desaparecida. Um homem que não sente os terramotos.
Quando um grande terramoto faz estremecer a ilha Terceira, o pequeno José Artur Drumonde dá-se conta de que não consegue sentir a terra tremer debaixo dos pés. Inexplicável, esse mistério há-de acompanhá-lo durante toda a vida. Mas, entretanto, é hora de participar na reconstrução da ilha, tarefa a que os passos e os ensinamentos do avô trazem sentido de missão.
Já professor universitário, carregando a bagagem de um casamento desfeito e uma carreira em risco, José Artur volta aos Açores. Durante as obras de remodelação da casa do avô, é descoberto um cadáver que o levará em busca dos segredos da família, da história oculta do arquipélago e de uma seita ritualista com ecos do mito da Atlântida. Mas é nos ódios que separam dois clãs rivais que o professor tentará descobrir tudo o que os anos, a insularidade e os destroços do grande terramoto haviam soterrado…
Usando a mestria narrativa e o apuro literário dos clássicos, bem como um dom especial para trazer à vida os lugares, as gentes e a História dos Açores, Joel Neto apresenta o romance Arquipélago, em que a ilha é também protagonista.”

Marcador, 2015