Cheguei desiludida à última página de “O Último Europeu”, e foi mesmo com algum desinteresse e custo que li a maioria do livro, principalmente a partir da segunda parte. Prossegui a leitura, ao contrário do que é meu hábito, por ser o livro da leitura em grupo do mês de Março, da Comunidade Leya em Grupo.
Esperava mais. Muito mais. Tanto da história como da narrativa, que considerei muito aquém do estilo e nível literário do autor.
A sinopse refere que se trata de uma utopia. De facto somos apresentados a uma sociedade em que não se trabalha, a população se entrega a todo o tipo de prazeres e ócio, os chamados neo-europeus vivem para a sociedade, para o grupo e não individualmente, o bem-estar de todos é primordial, tudo coisas fantásticas graças ao Grande Cérebro Electrónico que comanda estes carneirinhos bem comportados que não me convenceram serem superiores, avançados ou melhores.
Não é uma utopia pois tem traços distópicos, sendo o principal o total controlo da população, que sim, tem uma vida que podemos considerar utópica, mas que não foi uma escolha livre, é uma imposição, um conjunto de regras que são ditadas por um “Grande Irmão” que se chama Grande Cérebro Electrónico, mas que em nenhuma altura apresenta ao leitor um motivo para agir assim. Parece que fica a meio caminho para uma distopia a sério, ou será uma utopia a brincar?
Talvez eu não tenha percebido o objectivo do autor e haja neste livro uma revelação que só está ao alcance de alguns. Poderá tratar-se de uma ironia? Não faço, infelizmente, parte do grupo iluminado que captou a intenção do autor. Atravessei todo o livro com uma dúvida constante. A humanidade será tão pouco evoluída que, para o mau e para o bom (ou o que achamos ser bom), tem de haver sempre alguém ou algo que controle e dite regras? Iremos sempre obedecer cegamente? Mesmo que nos mudem o corpo, nos tirem o nome, nos impeçam de ter filhos, deixemos de ser filhos ou pais, se desvirtue a família, passemos a aspirar alimentos pelo nariz, ninguém se zanga, nem reclama, estão programados para gostar de tudo. Bem comportados, submissos, obedientes. Um povo avançado que é uma grande seca, que me aborreceu, e que sinceramente me apeteceu exterminar.
Esta Nova Europa e este livro não acrescentaram nada à minha vida. Irritei-me em vários momentos, praguejei escrevendo nas páginas, questionando sem evoluir. Vou considerar que não percebi, não atingi, não cheguei lá. Pois de outra forma não será mais do que é uma perda do meu tempo.
Resta-me a esperança de que, em conversa com o grupo, outras ideias lancem a luz na minha visão da coisa.
Sinopse
“Em 2284, a Europa é maioritariamente composta por Baldios governados por clãs guerreiros que escravizam as populações esfomeadas; subsiste, porém, um território isolado por um cordão de segurança com uma sociedade que, por via da ciência e da tecnologia, atingiu um nível altíssimo de felicidade individual, pois todos os desejos podem ser consumados, ainda que apenas mentalmente. Nesta Nova Europa, as relações sexuais são livres e não se destinam à procriação: as crianças, desconhecendo os pais, nascem nos Criatórios em placentas sintéticas e seguem para Colégios onde, sem a ajuda de livros, andróides especializados incrementam as suas competências como futuros Cidadãos Dourados. As famílias reúnem-se por afinidades, ninguém trabalha e nem sequer existem nomes, para que ninguém se distinga, já que todas as conquistas se fazem em nome da comunidade. Mas este mundo aparentemente perfeito sofre uma inesperada ameaça: a Grande Ásia, lutando com graves problemas de demografia, acaba de invadir a Europa... Um velho Reitor, estudioso do passado, é chamado a liderar uma equipa que possa refundar algures a Nova Europa e a deixar testemunho da sua História.
Vinte e cinco anos depois da queda do Muro de Berlim, Miguel Real constrói uma utopia sublime no contexto de um novo paradigma civilizacional, revelando o seu talento de escritor e filósofo e, ao mesmo tempo, chamando a atenção para o esgotamento da Europa actual.”
D. Quixote, 2015