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planetamarcia

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Junho 28, 2016

Morrer é mais difícil do que parece - Paulo Varela Gomes

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Não é um livro. É um texto. Foi publicado na Granta 5 (Falhar Melhor) e está disponível para leitura aqui.

É um texto brutal. Sim, foi escrito por um homem que sabia que iria morrer em breve, e não é melhor ou pior por isso. É uma história assustadora escrita com uma beleza ímpar.

Humano. Com as fragilidades isso implica e as forças inesperadas que, misteriosas, surpreendem nos momentos mais duros.

Não dá lições a ninguém nem ensina a aproveitar a vida. É uma descrição do fim.

Eu acho que o devem ler.

“A vida é muito menos cheia de prosápia do que a morte. É uma espécie de maré pacífica, um grande e largo rio. Na vida é sempre manhã e está um tempo esplêndido. Ao contrário da morte, o amor, que é o outro nome da vida, não me deixa morrer às primeiras: obriga-me a pensar nas pessoas, nos animais e nas plantas de quem gosto e que vou abandonar. Quando a vida manda mais em mim do que a morte, amo os que me amam, e cresce de repente no meu coração a maré da vida.”

Paulo Varela Gomes (1952-2016) foi professor dos ensinos secundário e superior até se reformar em 2012, autor de artigos e livros da sua área de especialidade (História da Arquitectura e da Arte), colaborador e cronista permanente de vários jornais e revistas, designadamente do «Público», autor e apresentador de documentários de televisão. Escreveu o livro de crónicas «Ouro e Cinza» e os romances «O Verão de 2012», «Hotel» (Prémio PEN Narrativa 2015), «Era Uma Vez em Goa» e «Passos Perdidos». Em 2015, publicou na revista Granta o texto «Morrer é mais difícil do que parece».

Junho 26, 2016

Ouro e Cinza - Paulo Varela Gomes - Opinião

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Por vezes tenho a sorte de ler livros que ficam comigo muito tempo. Não só depois de os terminar, o que acontece frequentemente, e ainda bem, mas enquanto os leio. É raro. Gosto de ler depressa. E muitas (demasiadas) vezes cometo o pecado de ler o final do livro já com a cabeça no próximo. Nenhum autor merece. Mas o leitor também não. Arrependo-me, mas não evito. Não corrijo. Reincido.

Mas quando um livro fica na mesinha de cabeceira alguns meses sem ser por me ter entediado dele, e o levo na mala mesmo sabendo que não terei tempo ou oportunidade de lhe pegar, sei que se entranhou o suficiente para ler umas linhas hoje e outras amanhã, protelando o final com desvios páginas atrás, adiando a distância à contracapa.

Mas esse dia chegou, e li todas as palavras de Ouro e Cinza. Algumas li várias vezes e sei que lerei muitas mais.

Do brilhantismo da escrita, à lucidez do autor, passando pelas paisagens que conheço, e olhando de espanto para aquelas que só vi nestas frases, tudo guardo.

Porque sabe bem pegar num livro de crónicas como este, todo lucidez, com um tratamento objectivo pelas coisas que se olham e, mesmo assim, deliciar o leitor como se fosse um romance. Nem sempre a verdade é bonita, por isso é que fugimos para a ficção. Mas um bom texto, aquele que nos ganha, pode ter cinco linhas e ser sobre o que se passa do outro lado da janela. Parece simples. Só é preciso saber escrevê-lo.

Sinopse

«São acerca de quê, estas páginas? Não sei como responder a esta questão. Sentimentos, sítios, ideias, objectos, imagens, climas, bichos, plantas.
Escrevi crónicas regulares para jornais e revistas durante trinta anos, desde 1984. Foram milhares e milhares de páginas. Habituei-me ao formato limitado, entre quinhentas e mil palavras por texto, mais coisa, menos coisa, e reparo hoje que, desde as primeiras crónicas, no "Blitz" e no "Jornal de Letras", encontrei uma certa facilidade nesse formato. O facto de serem poucas as palavras nunca evitou que dissesse asneiras, mas teve a grande vantagem de impedir que fossem muito graves. Por outro lado, poucas palavras implicam palavras certas. Aprendi a escolhê-las com cuidado.
Colaborei com o "Público" desde que este jornal apareceu, em 1990. Escrevi textos de variados géneros e, entre 2007 e 2013, crónicas regulares que se distribuíram por três séries: "Cartas de Cá" (mais de oitenta), "Cartas do Interior" (mais de cem) e "Cartas de Ver" (cerca de cinquenta). Foram muitas semanas e muita vida, muito ouro e muita cinza. Seleccionei para este livro algumas crónicas das duas primeiras séries, aquelas que ainda hoje me parecem bem, conjuntamente com alguns artigos mais longos, que saíram tanto no "Público" como em outras publicações. Espero que os leitores, tanto os que já conhecem estes textos como aqueles que nunca os leram, gostem da variedade do mundo observada em poucas palavras.» —PVG

Tinta da China, 2014